O neurótico constrói um castelo no ar. O psicótico mora nele. O psiquiatra cobra o aluguel. (Jerome Lawrence)
terça-feira, 31 de dezembro de 2019
ROMANCE FORENSE
PAPAI NOEL VISITA A SEDE DA OAB
(Adaptado a partir de um conto de Rafael Berthold, advogado, OAB-RS nº 62.120)
O presidente da OAB chega à instituição. Ele ainda se acomoda quando a secretária adentra ruborizada.
– Doutor, aguarda-o na recepção um senhor de paletó e gorro vermelhos, camisa social verde, gravata cinza clara... Tem jeito de advogado, mas diz ser o Papai Noel.
O dirigente atalha:
– Diga a ele que, no momento, não temos nenhum projeto social que necessite de imitadores de Papai Noel.
– Não, doutor! Ele insiste que é o próprio Papai Noel. E alega ter um assunto oficial para tratar com a OAB!
O presidente contrafeito acede:
- Diga que entre!
Noel acessa o gabinete, já desferindo o primeiro ataque:
– Vocês, advogados, vão acabar com o Natal!...
O presidente começa a sorrir – pensando ser um 1º de abril extemporâneo - e já se prepara para retrucar, quando o pretenso impostor abre um saco e exibe uma imensa e organizada lista, com os pedidos resumidos.
– Eu já atendo solicitações de todas as crianças do mundo! Mas a lista dos advogados, este ano, contém pedidos difíceis de atender e que não são da minha alçada.
O chefe da Ordem, então, lê a lista e encontra pedidos como: “Melhores honorários sucumbenciais; conciliadores não sendo postos a presidir audiências de instrução e julgamento; juízes não se recusando a receber advogados; agilidade na prestação jurisdicional; sentenças proferidas com brevidade; estagiários sendo só estagiários; desembargadores presentes no tribunal de segunda a sexta, dois turnos; pagamento dos precatórios”.
A lista segue nesta linha. Mas o presidente da OAB - advogado espirituoso que é – aproveita para apoiar as reivindicações da classe:
– Eu até incluiria, nessa lista, que o Supremo fuja da tentação de legislar... E penso que se o senhor, Doutor Noel, atendesse a todos os pedidos, os advogados certamente parariam de importuná-lo...
– Creio que sim, mas os senhores estão me confundindo: eu não sou Deus, sou Papai Noel. Eu trago presentes do Polo Norte em meu grande saco. Mas é impossível colocar todas essas situações forenses em meu saco.
A conversa termina amena, o pretenso Noel toma um cafezinho, agradece, despede-se e vai embora. Minutos mais tarde o presidente fica sabendo quem era o Noel visitante, de feições depressivas: um advogado jubilado, mentalmente atribulado com os desgostos sofridos com o aperto financeiro em que vive, depois de sua frustrada tentativa de receber incontáveis precatórios que o Estado não lhe paga.
E com um sorriso no rosto, arremata o presidente:
– E eu tenho que concordar com ele. De fato, situações como essas, não há saco que aguente...
Fonte: www.espacovital.com.br
segunda-feira, 30 de dezembro de 2019
O BRASIL NÃO ERA ASSIM
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Charge do Lane |
O Brasil não era assim e nossa tragédia não foi herdada de Portugal…
Percival Puggina
Se você ainda não está naquela fase da vida em que a gente começa a ser chamado de tio ou de tia, talvez não saiba o que vou lhe contar: o Brasil não era assim. É muito possível que professores lhe tenham dito que o Brasil é uma zona desde que os portugueses fizeram um loteamento no litoral brasileiro. Mas isso é falso. Nossa tragédia federal, estadual, municipal, fiscal, educacional, judicial, eleitoral, familial e moral não a herdamos de Portugal.
O que você vê e denuncia é deliberada construção da corrente política que se assenhoreou da consciência do povo brasileiro. Para alcançar esse objetivo incutiu-lhe o que de pior se pode coletar na filosofia e no pensamento político contemporâneo. Não, não se chega ao ponto em que estamos sem que isso seja produto de deliberadas ações políticas e culturais.
LUTA DE CLASSES – Senão, vejamos. Estímulo a toda possibilidade de conflito entre classes sociais, entre masculino e feminino, entre brancos e negros, entre homossexuais e heterossexuais, entre filhos e pais. Deliberada confusão entre autoritarismo e exercício da autoridade. Contenção da polícia e proteção ao bandido; vitimização deste e culpabilização de sua vítima. Redução da autoridade paterna, demasias do ECA, diluição do sentido de família num caleidoscópio de variantes afetivas.
Laicismo e interdição à religiosidade e à moral cristã. Incentivo político e jurídico a ações violentas contra a propriedade privada. Desumanização do humano e “humanização” dos animais. Justa proteção à flora e à fauna, às reservas naturais, aos santuários de procriação e desova, em berrante paradoxo com o estímulo ao aborto. Recursos públicos para a marcha das vadias, parada gay e marcha pela maconha.
Hipertrofia do Estado, corporativismo e aparelhamento da máquina pública. Escola com partido, kit gay, ideologia de gênero. Desvio de recursos das atividades essenciais do Estado para abastecer os fazedores de cabeças no ambiente cultural, tendo como resultado a degradação da arte e do senso estético. Combate sistemático ao bem e ao belo.
INSEGURANÇA – O consequente crescimento da criminalidade, da insegurança e das muitas formas de lesão à vida e ao patrimônio das pessoas é respondido com desencarceramento, abrandamento das penas, abandono do sistema carcerário e desarmamento da população ordeira.
Ter posição adversa aos itens listados acima é obrigação cívica, dever moral. É uma justificada repulsa que não atinge diretamente quem quer que seja, mas atitudes e condutas que, estas sim, afetam a vida das pessoas, suas famílias e a sociedade. Portanto, são males políticos e morais e, por motivos que saltam aos olhos de todo observador, provêm da mesma banda do leque ideológico. Qualquer exceção é ponto fora da curva e como tal deve ser visto. As naturezas são diversas, mas bebem água na mesma fonte.
XINGAMENTOS – No entanto, se você os denunciar, se mostrar a malícia de sua natureza e a necessidade de mudar diretrizes na vida social e política, surgem os xingamentos: Discurso de ódio! Preconceito! Censura! Fascismo! Direita raivosa! Quem perambula, ainda que eventualmente, nas redes sociais, por certo se depara com esses adjetivos sendo despejados sobre quem cumpre o dever cívico de se opor ao intolerável.
A situação e os problemas descritos decorrem da sistemática destruição dos valores que a eles se opunham, quando o Brasil não era assim. Para os destruir, investiu-se contra a família como instituição fundamental da sociedade e se combateu a Igreja até a anulação de sua influência.
Fonte: Tribuna da Internet
Fonte: Tribuna da Internet
domingo, 29 de dezembro de 2019
COMO ESCREVER BEM
COMO ESCREVER BEM
(Desconheço o autor)
(Desconheço o autor)
1. Desnecessário faz-se empregar
estilo de escrita demasiadamente rebuscado, conforme deve ser do conhecimento
de V. Sa. Outrossim, tal prática advém de esmero excessivo que beira o
exibicionismo narcisístico.
2. Evite abrev., etc.
3. Anule aliterações altamente abusivas.
4. "não esqueça das maiúsculas", como já dizia carlos machado, meu professor lá no colégio santa ifigenia, em salvador, bahia.
5. Fuja dos lugares-comuns como o diabo foge da cruz.
6. O uso de parênteses (mesmo quando for relevante) é desnecessário.
7. Estrangeirismos estão out, palavras de origem portuguesa estão in.
8. Seja seletivo ao usar palavras de gíria, bicho, mesmo que sejam maneiras. Sacou, mane?
9. Palavras de baixo calão podem transformar seu texto numa merda.
10. Nunca generalize: generalizar sempre é um erro.
11. Evite repetir a mesma palavra, pois essa palavra vai ficar repetitiva. A repetição vai fazer com que a palavra seja repetida.
12. Não abuse das citações. Como costuma dizer meu pai: "Quem cita os outros não tem idéias próprias".
13. Frases incompletas podem causar.
14. Não seja redundante, não é preciso dizer a mesma coisa de formas diferentes, isto é, basta mencionar cada argumento uma só vez. Em outras palavras, não fique repetindo a mesma idéia.
15. Seja mais ou menos especifico.
16. Frases com apenas uma palavra? Corta!
17. A voz passiva deve ser evitada.
18. Use a pontuação corretamente o ponto e a virgula especialmente será que ninguém sabe mais usar o sinal de interrogação
19. Quem precisa de perguntas retóricas?
20. Nunca use siglas desconhecidas, conforme recomenda a A.G.O.P.
21. Exagerar é 100 bilhões de vezes pior do que a moderação.
22. Evite mesóclises. Repita comigo: "mesóclises: evita-las-ei!"
23. Analogias na escrita são tão úteis quanto chifres numa galinha.
24. Não abuse das exclamações! Seu texto fica horrível! Sério!
25. Evite frases exageradamente longas, por dificultarem a compreensão da idéia contida nelas, e, concomitantemente, por conterem mais de uma idéia central, o que nem sempre torna o seu conteúdo acessível, forçando, desta forma, o pobre leitor a separá-la em seus componentes diversos, de forma a torná-las compreensíveis, o que não deveria ser, afinal de contas, parte do processo da leitura, hábito que devemos estimular através do uso de frases mais curtas.
26. Cuidado com a orthographia, para não estuprar a língua.
27. Seja incisivo e coerente. Ou talvez seja melhor não.
sábado, 28 de dezembro de 2019
OS NOVOS ANALFABETOS
OS NOVOS ANALFABETOS
A alfabetização foi um ideal reivindicado pelos movimentos progressistas e iluministas. Na medida em que para viver no mundo foi necessário, cada vez mais, acercar-se dos textos, saber ler e escrever foi considerado como algo diverso de uma ferramenta: começou a ser uma condição de possibilidade da experiência; para saber o que sucedia havia que ler nos livros. Assim foi crescendo uma cultura letrada e foi se configurando uma marginalidade de analfabetos.
A Galáxia Gutenberg – que equivale a falar em modernidade – requereu a universalização em todos os planos. Se antes o ler e escrever era uma tarefa de especialistas e não constituía uma condição de possibilidade da experiência, com o aparecimento da imprensa e da escola positivista, a educação se converteu em obrigatória, gratuita e popular e, com ela, o surgimento de uma nova sensibilidade. A democratização veio de mãos dadas com a alfabetização; as chaves do mundo já não eram secretas.
No ocidente foi crescendo durante os últimos trezentos anos uma classe média de profissionais que, através da alfabetização qualificada, passou a ter acesso ao manejo especializado do mundo. O conhecimento dava conta dos diferentes modos de acesso a uma realidade segmentada. A fragmentação do saber coincidia com a fragmentação da realidade. Porém tudo isto está mudando.
Hoje nos encontramos com uma situação muito complexa onde uma profunda mudança de paradigma está se manifestando no aparecimento de um novo analfabetismo. Efetivamente, a informática e, sobretudo, a abertura da Internet, é o começo de uma nova constelação que vai começando a desbancar a Galáxia Gutenberg. Porém isto não pode ser compreendido como uma mera transformação de instrumentos que deixa intacto o sentido das coisas e do ser humano. Hoje está aparecendo um novo tipo de analfabetismo que não consiste apenas em desconhecer computação senão que também fala de uma diferente sensibilidade.
Assim como em “sede Gutenberg” o sentido de mundo se lia nos livros (para o que nos preparava a escola), atualmente o sentido do que ocorre começa a “ser lido” em outro registro, no registro virtual de ordem telemática. Porém o aparecimento desta ordem é a nova condição de possibilidade da experiência e, como não se trata de um problema instrumental senão de uma paralela transformação do sentido do ser, do acontecer, nos encontramos em uma situação delicada. Diria que nós os alfabetizados tradicionais estamos cada vez mais inermes: somos os novos analfabetos.
A nova sensibilidade experimenta o mundo de modo vertiginoso, sem afirmação da verdade, com outro sentido para a ética (que em vez de dever-ser vai se transformando em poder-ser). Por isso a tradicional idéia de poder pensado a partir de algum centro esta se convertendo em fluídos (de informação, de produção de bens, de transações financeiras, da política, de propostas múltiplas, etc). A nova alfabetização deixa uma marginalização de um diferente tipo de analfabetos. Advertir é o único meio que pode evitar que fiquemos fora do novo mundo.
JALFEN, Luiz J. Globalización y Lógica Virtual. Ediciones Corregidor, 1998, Buenos Aires, p. 139)
sexta-feira, 27 de dezembro de 2019
MR. MILES
Quando o cotidiano fala diretamente com você
Nosso cavalheiresco correspondente já encomendou as rosas colombianas que, em todos os anos, ele entrega para sua monarca na data do aniversário, o próximo dia 21 de abril. Para quem não sabe, as rosas colombianas são enormes, têm cores muito peculiares e duram uma eternidade. "É um compromisso que tenho com a rainha (e comigo mesmo, of course, há mais de 60 anos. Tenho a pretensão de afirmar que ela sempre ficou feliz.
A seguir, a pergunta da semana
Mr. Miles: basta ler um guia de boa qualidade para saber que atrações turísticas merecem ser visitadas em qualquer país. O senhor, que viaja tanto, poderia me dizer o que mais é indispensável fazer em um primeiro contato com um novo lugar?
Celiana Armandez Giggo, por email
Well, my dear, sua pergunta esconde os melhores segredos de um viajante. Yes, of course: é preciso visitar os chamados protagonistas de uma cidade ou de um país. Os monumentos pelos quais são conhecidos, as paisagens que deles até se tornaram lugares-comuns. Como ir, for instance, à Veneza e não observar, com detalhes, uma gôndola? Ou visitar o Egito passando ao largo das Pirâmides de Gizé?
Na minha humilde opinião de eterno peregrino, however, o melhor jeito de conhecer um lugar é reviver, alhures, o seu próprio cotidiano, mas, dessa vez, prestando muita atenção — já que o que se torna rotina em casa acaba incorporado à cabeça como mais um fio de cabelo em um vasta juba.
Vou tentar lhe dar algumas dicas, lembrando que elas podem variar muito de país para país e de acordo com seu próprio entendimento do idioma em questão. Comece pelo dinheiro local, que você vai adquirir na chegada. Veja seus desenhos, suas cores, suas referências. As cédulas costumam mostrar heróis nacionais, exibir as riquezas da natureza de cada lugar e falam até da alma do povo. Na Polinésia francesa, por exemplo, o franco local é colorido com toda a variedade da natureza luxuriante daquele arquipélago. O escudo português, em tempos salazarianos, era triste e melancólico como um fado. E as falecidas liras italianas tinham tantos zeros que era difícil contar. Nada parecido, by the way, com uma nota que tenho guardada em casa. Valor? 100 trilhões de dólares! Do Zimbabwe, unfortunately. A maior já emitida no planeta, durante a hiperinflação de 2008. Com ela, however, mal se comprava um pacote de biscoitos no supermercado.
E falando em supermercados, dear Celiana, não deixe de entrar em um deles, não importa aonde. Haverá, of course, produtos globalizados nas prateleiras. Mas grande parte dos itens à venda dirão muito sobre o modo como os habitantes do lugar alimentam-se, limpam suas casas e fazem sua higiene. Entrar em um supermercado, de certa forma, é como entrar na área íntima de uma residência local. Uma espécie de xeretagem...
Indispensável é comprar um jornal, mesmo que você não entenda patavinas! O aspecto do jornal, o peso que se dá a cada seção, tudo é informação privilegiada sobre quem vive na cidade ou no país. Se, for instance, você encontrar oito páginas sobre cricket e nenhuma menção ao futebol, é melhor não citar Pelé ou Neymar como referências. Os mercados também são indispensáveis. Neles você verá a fartura ou a escassez de cada povo. As frutas que se come por ali, as carnes, os peixes. E, of course, a maneira como vendedores e compradores se entendem.
É uma mágica! No cotidiano (muito mais do que na atração turística) é a vida que fala diretamente com você. Nas roupas que as pessoas usam, no jeito que elas rezam (vá, sempre, a um serviço religioso, seja lá qual for a crença local), e nas coisas que fazem nas praças. Escolha um banco em uma praça movimentada. Você vai ver se as pessoas têm pressa ou se são serenas. Verá como brincam as crianças, como comportam-se os idosos, o quanto riem ou são silenciosas aquelas populações. E, last but not least, conforme o lugar onde estiver, você terá a chance de olhar (ainda que discretamente) como agem os enamorados. E assim, my dear, sua viagem será, sem dúvida, ainda muito melhor.
Fonte: Facebook
quinta-feira, 26 de dezembro de 2019
NÃO TROPECE NA LÍNGUA
LÍTERO-MUSICAL, INFANTO- JUVENIL E ESPAÇO-TEMPORAL
--- A senhora diz que se escreve lítero-musical. Permita-me discordar: a grafia certa é literomusical, como registram Aurélio e o Vocabulário da ABL. Ocorre que lítero- é um elemento de composição, e não um adjetivo, como esclarece o Houaiss. Por isso, literofobia, literomaníaco, literomusical e, por analogia, literorrecreativo. S. S., Recife/PE
Eis uma boa discussão para quem gosta dos detalhes da língua portuguesa. Acrescentei-lhe mais duas palavras compostas cuja grafia tem sido objeto de dúvida e hesitação, como evidencia a variação de registro encontrada.
Literatura e música. Na prática, temos três formas em voga para significar algo que engloba os sentidos de literário e ao mesmo tempo musical, como um sarau, um encontro, um evento, uma realização: lítero-musical, literário-musical e literomusical.
Lítero-musical – adjetivo composto da forma reduzida (que vem a ser um elemento de composição) do adjetivo literário mais o adjetivo musical. Conquanto seja uma grafia usada há séculos, não vi nenhum registro de lítero-musical nos dicionários editados entre 1957 e 2002, mas isso porque eles trazem poucos adjetivos compostos: encontra-se econômico-financeiro, porém não se vê técnico-financeiro e nem econômico-ecológico, por exemplo.
Literário-musical – é o mesmo adjetivo composto sem a redução do primeiro elemento. Aparece no Houaiss, edição de 2001, mas não nos dicionários Aurélio e Houaiss lançados depois do Acordo Ortográfico. No entanto, ambos trazem literário-editorial (relativo à edição de obras literárias).
Literomusical – a grafia sem hífen e sem acentuação é a registrada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) e no Aurélio de 1999 e de 2009 (as edições de 1985 e 1986 a omitem). A pronúncia deveria ser liTEromusical, pois se trata de palavra oxítona, isto é, há um acento subtônico na segunda sílaba e tônico na última, pois em princípio não existe na língua portuguesa palavra com duas sílabas tônicas. Esta grafia confirma uma tendência à eliminação do hífen, como se dá em “socioeconômico”, mas não é a melhor.
Elemento de composição. O Houaiss 2009 não apresenta nem uma forma nem outra: esquecimento ou discordância? No mínimo, coerência com o que consta no seu rol de elementos mórficos. Ali se informa que “lítero” é elemento de composição, com o sentido de “letra”; entretanto é preciso notar o tracinho na frente [ -lítero], a mostrar que é pospositivo, ou seja, que ajuda a formar uma palavra como segundo elemento, por exemplo: unilítero, bilítero. O elemento de composição antepositivo é “liter-”, correspondente ao popular “letr-”, que se encontra nas palavras literal, literatura, iliteratrice etc., e também nas novas formações como literomania, “obsessão por escrever, por ser literato”, e literofobia, “aversão às letras, à instrução” – nestes dois casos não se trata de uma soma (cf. Não Tropece na Língua 300), como se dá com lítero-musical, lítero-poético, lítero-recreativo (literário E recreativo).
Para reforçar isso com outros exemplos: em anglo-saxão e afro-brasileiro vê-se o resumo de inglês E saxão, africano E brasileiro. Já em anglomania e afrodescendente temos: mania de inglês, descendente de africano.
Infância e juventude. O VOLP 2009 traz infantojuvenil sob o argumento de que infanto é falso prefixo. Desconheço tabela de falsos prefixos ou pseudoprefixos que contenha infanto e litero, que sempre foram considerados redução dos adjetivos infantil e literário. Até o final de 2012 não constituirá erro escrever infanto-juvenil. Creio que mesmo depois disso continuaremos a ver delitos infanto-juvenis e literatura infanto-juvenil, por exemplo, ao lado das formas sem hífen.
Espaço e tempo. O adjetivo relacionado a espaço-tempo (na física, redução de “contínuo espaço-tempo”) já foi espaço-temporal, espácio-temporal e espaciotemporal. Em 2009 a grafia oficial, registrada no VOLP e no Houaiss, passa a ser espaçotemporal. O Aurélio omite o termo. E eu novamente tenho de discordar, recomendando que se adote o adjetivo composto espaço-temporal.
Fonte: www.linguabrasil.com.br
quarta-feira, 25 de dezembro de 2019
TUDO ISSO E MAIS UM FELIZ NATAL
TUDO ISSO E MAIS UM FELIZ NATAL
Que você consiga desgrudar das redes sociais, que dê uma longa caminhada sem que seus joelhos incomodem, que o sol apareça no dia que você tanto aguarda, que sair da dieta não interfira na sua silhueta, que você tenha a oportunidade de ajudar alguém que está precisando, que ouça agora mesmo a música que você mais gosta, que os amigos que se sentiram magoados façam a gentileza de colocar uma pedra no assunto, que o vinho branco esteja indecentemente gelado, que o livro que você está lendo mantenha-se interessante até o final, que você encontre um presente baratinho, que por alguns minutos você esqueça os problemas do país, que você reconheça bonito ao se olhar no espelho e que tenha um feliz Natal.
Que você encontre o anel dos seus sonhos numa feira de rua, que pegue o último canapé do prato sem culpa, que reze mesmo sem crer o suficiente, que não dependa de companhia para viajar, que não perca muito tempo se arrependendo, que deixe a vida um pouco nas mãos do destino, que reveja fotos antigas, que tome um banho de mar inesquecível, que vá à luta por uma camiseta que seja a sua cara, que transe com alguém bem legal, que segure dentro da boca uma maldade, que chore sem ficar com o rosto inchado, que o check-up não acuse nada, que ganhe dois ingressos para o show do ano e que tenha um feliz Natal.
Que você pare de reclamar, que em tudo perceba alguma graça, que resolva ir caminhando em vez de tirar o carro da garagem, que use de uma vez aquela camisa escandalosa ou doe para uma escola de samba, que escute ambos os lados antes de distribuir acusações, que um WhatsApp salve o seu dia, que encontre uma nota de 50 reais no bolso da caça que está indo para a lavanderia, que te convidem para passar o carnaval num lugar incomum, que tire bom proveito da insônia, que suma a espinha maldita que apareceu no nariz, que o dia termine sem nenhum contratempo e que tenha um feliz Natal.
Que você não leve um tombo na escada, que não fique preso no elevador, que não perca o chinelo de dedo na praia, que a chuva não estrague seu cabelo, que você mentalize que tudo pode ser simples, que pense duas vezes antes de fazer uma tatuagem no rosto, que vá para Londres sem mais nem menos, que sua barriga pare por aí, que consiga pagar dia seu seguro-saúde, que você descubra o prazer de uma lanchonete de beira de estrada, que quando pedirem uma opinião sincera você não caia nessa, que entre fazer a coisa certa e a coisa errada você escolha fazer a coisa certa, que não subestime a importância das trivialidades e que tenha um feliz Natal.
É tudo o que desejo pra você dentro do espírito de generosidade abundante que a data inspira.
O Globo - 13/12/2015
CARANGUEJEIRA
CARANGUEJEIRA
Sérgio Jockymann
Pois, coitado do seu Rubinho até que era boa pessoa. Mas nascer de pai bêbado e de mãe sem vergonha é mais do que a sorte que um vivente pode aguentar. Seu Rubinho já veio com um desfastio de nascença. No princípio ainda tentou tirar o pé do barro, mas depois pegou um cansaço daquela luta e quando bateu uma peste na criação enterrou o último boi e disse para a mulher:
- Nasci pra Cristo.
Começou então a vender o campo, palmo a palmo, enquanto os filhos cresciam e a mulher minguava. Ficou cinco anos nisso, até que um dia sentou no alpendre e ficou lá bem contadinhos três sóis e três luas, sem ouvir ninguém, mergulhado num pensamento de légua e meia para dentro da desgraça. Quando acordou, pegou o mate, chamou a mulher e após um silêncio de meia hora declarou:
- Tem de haver um revertério nessa nossa vida, senão, não sei o que vai ser da piazada.
Dona Marcolina espremeu um suspiro e não disse nada, porque existem verdades que nem precisam de confirmação.
- Olhe, continuou seu Rubinho, tenho um sentimento que vai haver qualquer coisa meio diferente na minha vida.
No dia seguinte se mandou para Vila Velha e passou um mês inteiro bebendo cachaça no Café Central, com um jeito de onça esperando cabrito. Enquanto o cabrito não vinha, seu Rubinho foi fazendo amizades, metendo o nariz curtinho nas prosas do café, até que virou pessoa da casa. Já isso ia lá para o segundo mês, quando o dr. Aristides inventou de discutir aranha, porque havia corrido de uma na noite anterior. A conversa se alastrou como fogo em capim seco, até que, coroando a nojeira toda, o dr. Aristides declarou:
- Agora, não tem veneno pior do que caranguejeira.
Todas as cabeças estavam concordando, quando seu Rubinho cuspiu pelo meio dos dentes e disse que não concordava. Houve um estarrecimento geral, porque o dr. Aristides era tido e sabido como o mais bem informado do município todo, mas nem por isso seu Rubinho se intimidou. Muito pelo contrário, quando o dr. Aristides disse que ele "elaborava em engano", seu Rubinho meio que desaforadamente insistiu:
- O engano é seu, doutor. Caranguejeira morde, mas não tem veneno.
Ora, Vila Velha sentia no ar, quando a tragédia se instalava na vida. Foi seu Rubinho dizer aquilo e logo todo mundo espichou o olhar para o dr. Aristides, sabendo que a cidade estava vivendo mais um de seus grandes momentos. O dr. Aristides tomou aquele ar de enciclopédia Jackson encadernada em marroquim e com o mais puro desprezo atirou:
- Prove!
Seu Rubinho já ia escapar por um sorriso, quando também teve um súbito sentimento da gravidade do momento e para seu próprio espanto se ouviu dizer com uma voz rouca como cova de cemitério:
- Provo e aposto.
Até cachorro entrou no Café Central atrás do desfecho do confronto. O dr. Aristides mandou servir uma cerveja para todos os presentes e após o primeiro copo, quando o pessoal lambia os bigodes de espuma com a ponta da língua, tripudiou:
- Vale cem contos, seu Rubinho.
Houve gente que gemeu, seu Matias que estava louco da vida para desaguar enfiou a mão no bolso e apelou para a pressão manual a fim de não perder um segundo do duelo e o velho Riva ameaçou um enfarte, que naquele tempo se chamava angina do peito. Só seu Rubinho não falava, branco como cera, com os músculos da face esperneando de um lado para outro. Quando falou, a voz saiu primeiro como fio de navalha e, só depois de um pigarro, pegou a grossura que o momento exigia:
- Tá aceito.
O velho Riva caiu de borco e seu Matias saiu pingando pelo corredor. O resto do pessoal roncou como porco embaixo de faca. Só quem saiu voando foi o Guajuvira, o tipo mais cafajeste de capanga que já pisou na face da terra. A aposta nem estava feita e o desgraçado já pensava naquela caranguejeira medonha que vivia atrás da igreja, metida numa raiz de figueira. Saiu aos berros de "deixa-que-eu-trago", enquanto o dr. Aristides, meio intimidado pela decisão do seu Rubinho, tomava ares de protetor das famílias.
- Olhe, seu Rubinho, o senhor é maior de idade, mas não quero responsabilidade. Vou lhe pedir que assine uma declaração, dizendo que se deixou picar por livre e espontânea vontade, assumindo inteira responsabilidade pelo seu ato.
Seu Rubinho nem conseguiu falar. Fez que sim com a cabeça e ajudou a levar seu Riva para outra sala. Quando voltou, o Guajuvira despejava uma caranguejeira de palmo em cima da mesa. Foi olhar para o bicho e seu Rubinho puxou um sorriso que não conseguiu mais desfazer por mais que tentasse. Caminhou para a mesa com a cara repuxada e estendeu a mão para a desgraçada da aranha. A caranguejeira, já danada da vida com as provocações do Guajuvira, tocou os dois ferrões na polpa da mão do seu Rubinho com toda a gana que tinha. Nem mesmo assim ele deixou de sorrir. E continuou sorridente quando o sangue negro brotou dos dois furinhos. Metade da sala ficou de cabelo em pé e quando uma mosquinha de nada pousou no cabelo do seu Gustavo, ele esqueceu que estava com uma garrafa de cerveja na mão e bateu nela. Levou bem um minuto o horror geral, desfeito pelo seu Matias que deu três tiros na peçonhenta. O Guajuvira então riu daquele jeito cretino que ele tinha e anunciou:
- Uma hora e o homem morre!
Seu Rubinho balançou a cabeça cheio de superioridade e continuou a sorrir. Seu Schmidt trouxe um como d'água e pôs na frente da vítima que não aceitou. Aí bateu um medo em todo mundo que seu Rubinho morresse e ninguém mais conseguiu falar. Três horas depois, quando o Rapadura entrou e começou a dar boa tarde, levou um bofetão do Seu Matias e calou a boca. Lá pelas cinco começou a vir gente e gente até que às oito da noite não havia mais lugar no café. E seu Rubinho sentado com um sorriso nos lábios. O dr. Aristides então começou a desejar furiosamente que a vítima tivesse um desmaio e, uma hora depois, não tinha nem mais vergonha de querer que seu Rubinho caísse morto. Só que seu Rubinho continuava não apenas vivo como também sorridente.
- Tá sentindo alguma coisa?
Seu Rubinho balançou a cabeça.
- Febre?
Seu Matias tocou na testa do Rubinho e disse que estava fresquinha. Meia noite, o dr. Aristides ensaiou uma esportividade amarela e assinou o cheque.
- Pago os cem pela satisfação de ver o senhor vivo.
O café inteiro explodiu. Seu Rubinho foi abraçado, beijado, bebido e discursado. Às duas da manhã, depois de tentar meia hora, conseguiu desfazer o sorriso e disse:
- Me dão licença, mas a patroa me espera.
Foi levado em comitiva até à estância. Bateram por lá ao nascer do sol. Dona Marcolina estava de pé e quando recebeu a notícia não sabia se ria ou se chorava. Mandou servir café para todo mundo e levou o marido para o quarto. Mal fechou a porta e seu Rubinho pôs até as tripas para fora. Ela quis pedir socorro mas ele não deixou:
- Perco o dinheiro, minha filha.
Teve uma tontura e se agarrou na mulher.
- Me leva pra cama.
Ficou na metade do caminho, emborcado em cima de um pelego. Durante três dias não se mexeu, ora fervendo como uma chaleira, ora gelando como uma geada. Só voltou a si no segundo dia, quando olhou a mulher e meio num ronco de bicho disse:
- Se não morri lá, não morro mais. E não morreu mesmo. Uma semana depois estava de pé e pronto a jurar que a caranguejeira não tinha veneno. No mês seguinte, vendeu as terras e se mandou com a família para a capital com cento e poucos contos no bolso, o que era um dinheirão que não acabava mais. E nunca soube que, três anos depois, o Guajuvira fez a mesma aposta e morreu preto, de uma mistura de veneno, medo, coração fraco e cafajestice. (JOCKYMANN, Sérgio. Vila Velha, Porto Alegre : Editora Garatuja, 1975, p. 44)
terça-feira, 24 de dezembro de 2019
O NATAL NO FOLCLORE BRASILEIRO
O NATAL NO FOLCLORE BRASILEIRO
Paulo Peres
Imunes à parafernália dos símbolos natalinos europeus de neves, Papai Noel, trenós, renas e pinheiros, algumas regiões brasileiras ainda conseguem fazer um Natal adequado a nossa cultura popular, sob o verão dos trópicos. A tradição natalina dos brasileiros manifesta-se, autenticamente, nos cantos e danças inventados pela imaginação criadora do povo para acrescentar novas informações ao legado de nossos antepassados índios, negros, portugueses.
Bois de pano e couro, cangaceiros, reis, rainhas, palhaços, embaixadoras e pastoras saúdam o nascimento do Menino com fé, ingenuidade e a peculiar alegria brasileira. Uma festa bem diferente das realizadas nos grandes centros de consumo.
Há vários folguedos no ciclo natalino, que se inicia em 24 de dezembro e se estende até 6 de janeiro, com a Festa de Reis. Cerimônias, rituais e coletivas, resultantes da trocas culturais entre os indígenas, africanos e portugueses, são encenadadas em todo o país, sempre com peculiaridades locais: reisado, guerreiro, bumba-meu-boi, pastoris e folia de reis ou santos reis.
segunda-feira, 23 de dezembro de 2019
AS COISAS NÃO MUDAM
AS COISAS NÃO MUDAM
As coisas não mudam. Nós mudamos.
A frase acima é de Henry David Thoreau.
O texto, abaixo, de Aldo Novak.
Talvez o mundo mude amanhã. Mas isso não é provável. As mudanças no mundo são lentas, apesar de toda a corrida que alguns de nós enfrentamos todos os dias.
Ainda assim, seu mundo pode mudar de modo impressionante, nas próximas 24 horas. Na verdade, pode mudar na próxima hora. Porque tudo o que você está vendo, sentindo e tudo ao que você está reagindo, o faz porque existe um mundo real e um mundo "filtrado".
A forma como vemos o mundo é chamada de "paradigma", palavra grega que foi "reapresentada" ao mundo científico por Thomas Kuhn em seu livro "A Estrutura das Revoluções Científicas", que mostrou que todas as grandes revoluções aconteceram devido a mudanças na forma de ver o mundo, na ruptura com o modo como estávamos olhando para o universo. A ciência não mudou, depois de Kuhn, nós mudamos.
Essa é a parte curiosa. Todos nós filtramos o universo de acordo com nossas próprias expectativas, crenças e princípios de vida. Por isso, uma mesma cena pode comover uma pessoa e não causar absolutamente nada em outra, cada uma delas teve uma diferente reação àquilo que viu com um filtro mental diferente.
Stephen R. Covey, conta uma história que viveu no metrô de Nova York. Veja o que quero dizer:
“Eu me recordo de uma mudança de paradigma que me aconteceu em uma manhã de domingo, no metrô de Nova York. As pessoas estavam calmamente sentadas, lendo jornais, divagando, descansando com os olhos semicerrados. Era uma cena calma, tranqüila”.
Subitamente um homem entrou no vagão do metrô com os filhos. As crianças faziam algazarra e se comportavam mal, de modo que o clima mudou instantaneamente.
O homem sentou-se a meu lado e fechou os olhos, aparentemente ignorando a situação. As crianças corriam de um lado para o outro, atiravam coisas e chegavam até a puxar os jornais dos passageiros, incomodando a todos. Mesmo assim o homem a meu lado não fazia nada.
Ficou impossível evitar a irritação. Eu não conseguia acreditar que ele pudesse ser tão insensível a ponto de deixar que seus filhos incomodassem os outros daquele jeito sem tomar uma atitude. Dava para perceber facilmente que as demais pessoas estavam irritadas também. A certa altura, enquanto ainda conseguia manter a calma e o controle, virei para ele e disse:
- Senhor, seus filhos estão perturbando muitas pessoas. Será que não poderia dar um jeito neles?
O homem olhou para mim, como se estivesse tomando consciência da situação naquele exato momento, e disse calmamente:
- Sim, creio que o senhor tem razão. Acho que deveria fazer alguma coisa. Acabamos de sair do hospital, onde a mãe deles morreu há uma hora. Eu não sei o que pensar, e parece que eles também não conseguem lidar com isso.
Podem imaginar o que senti naquele momento? Meu paradigma mudou. De repente, eu vi as coisas de um modo diferente, e como eu estava vendo as coisas de outro modo, eu pensava, sentia e agia de um jeito diferente. Minha irritação desapareceu. Não precisava mais controlar minha atitude ou meu comportamento, meu coração ficou inundado com o sofrimento daquele homem. Os sentimentos de compaixão e solidariedade fluíram livremente.
O mundo não mudou, não é? Mas você mudou, ao ler o texto. Mudou de paradigma, e isso causou uma diferente reação em seu corpo. Você e eu nunca vemos a realidade total. Vemos apenas uma parcela dela, que selecionamos, em grande parte inconscientemente.
A única prisão real que você tem está em cima dos seus ombros. E só você tem a chave mestra. Como afirmava Henry David Thoreau: "as coisas não mudam; nós mudamos".
domingo, 22 de dezembro de 2019
DESCANSO FÍSICO E ESPIRITUAL
Ao longo de qualquer viagem acabamos visitando igrejas, catedrais, mosteiros, Santuários, etc. Há verdadeiras obras de arte, revelando o poderio econômico de quem patrocinou a construção. A época em que foram construídas proporciona outras revelações. O estilo arquitetônico também pode se revelar uma excelente fonte de pesquisa. Particularmente gosto de esculturas e muitas catedrais são pródigas neste item. Também me interessam as construções por elas mesmas. Meu pai era pedreiro e durante a minha infância o acompanhei muitas vezes até o local das obras onde ele empregou o seu conhecimento. A facilidade, ou melhor, a destreza que ele tinha para movimentar aquelas pedras enormes, edificando altas paredes, sempre me fascinou. Especialmente o conhecimento empírico de equilibrar as pedras no alto das portas, sem argamassa ou apoio transversal, para mim era um verdadeiro mistério. Agora, com a compreensão de como tudo isso é possível, ao visitar as catedrais sempre fico imaginando as dificuldades enfrentadas pelos antigos construtores, principalmente no que diz respeito à necessidade de andaimes para alçar as pedras às alturas. As coberturas com seus imensos vãos a desafiar a lei da gravidade também incitam a imaginação. Mas tem um outro motivo para tantas e reiteradas visitas a igrejas e catedrais: o bem estar físico. Isto mesmo, o bem estar físico. Geralmente viajamos na primavera ou no verão. Para conhecer os lugares é preciso caminhar, e muito. Quando estamos cansados e o dia está quente, entrar numa igreja é recarregar as baterias. De um modo geral são ambientes bem fresquinhos e sempre há lugares disponíveis para sentar. Descansar no interior de uma igreja, com silêncio quase total, é um prazer reconfortante. É quando corpo e mente se fundem e se harmonizam. É o melhor momento para agradecer. Pela vida, principalmente.
TURÍBULO
O MAIOR TURÍBULO DO MUNDO
A partir do Século IV, a tradição cristã adotou o incenso em seus rituais de consagração e ainda hoje o queima para honrar o altar, as relíquias, os objetos sagrados, os sacerdotes e os próprios fiéis, e para propiciar a subida ao céu das almas dos falecidos no momento das Exéquias.
Desde o século IX, instaurou-se o uso do incenso no início da Missa e desde o século XI o altar se transformou no centro da incensação.O turíbulo era também levado na procissão junto com o evangeliário. Em seguida, a incensação estendeu-se às oferendas do pão e do vinho, que são incensadas três vezes em forma de cruz, da mesma maneira como se procede com o altar e a comunidade litúrgica.
O agitar do turíbulo em forma de cruz recorda principalmente a morte de Cristo e seu movimento em forma de círculo revela a intenção de envolver os dons sagrados e de consagrá-los a Deus. (www.coroinhassaomiguel.com.br)
A catedral de Santiago é superlativa até nos detalhes. O incensório, por exemplo, é o maior do mundo. Preso na cúpula, pesa mais de 50 quilos e precisa da força de oito homens para ser balançado sobre o altar principal, de uma ponta à outra das duas naves laterais. Hoje em dia, o turíbulo é usado só em ocasiões especiais, como em 25 de julho, dia de Santiago, mas na Idade Média o bota-fumeiro tinha utilização frequente.
Sem uma grande quantidade de incenso, o ar na catedral se tornava irrespirável devido à presença de centenas de peregrinos que lá chegavam depois de caminhadas de até dois anos sem se lavar, como era o costume. Para saber mais sobre a Catedral de Santiago de Compostella clique aqui.
sábado, 21 de dezembro de 2019
CAÇADORES E OBRAS PRIMAS
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
SÃO PAULO, 13 Fev (Reuters) - Em 1943, quando a 2ª Guerra Mundial entrava na reta final, um grupo de especialistas em arte, em boa parte norte-americanos, recebeu uma missão inusitada: descobrir os esconderijos de milhões de obras de arte roubadas pelos nazistas, impedindo sua destruição, agora que a derrota alemã começava a mostrar-se iminente.
O trabalho desse insólito esquadrão é retratado na aventura de época "Caçadores de Obras-Primas", dirigido e interpretado por George Clooney. Ele também assina, com seu habitual parceiro, Grant Heslov, o roteiro, que adapta o livro homônimo de Robert M. Edsel e Bret Witter.
Na história real, estes especialistas foram mais de 300, alguns deles mulheres. Na tela, por uma questão logística, eles são reduzidos a um pequeno grupo de sete homens, cujos nomes são, em geral, fictícios e não raro incorporam características de mais de um personagem verídico.
O líder é Frank Stokes (Clooney), que convence o presidente norte-americano Franklin D. Roosevelt da importância de salvamento das obras de arte e dele recebe autorização para formar uma equipe e viajar para a Europa.
Stokes convoca o seu time: o curador de museu James Granger (Matt Damon), o escultor Walter Garfield (John Goodman), os arquitetos Preston Savitz (Bob Balaban) e Richard Campbell (Bill Murray), todos americanos. Também entram na roda o inglês Donald Jeffries (Hugh Bonneville, da série "Downton Abbey") e o francês Jean-Claude Clermont (Jean Dujardin).
Recebendo um precário treinamento militar prévio, eles se deslocam até os fronts de batalha, colocando a pele em risco para localizar as preciosas obras-primas europeias que os nazistas vinham saqueando, de instituições ou de coleções particulares - especialmente de judeus -, tendo em vista o sonho de Hitler de formar um imenso museu na Alemanha com o produto dessas apropriações.
Quando os alemães começam a sofrer derrotas dos Aliados, muitas dessas obras foram escondidas - algumas, destruídas. A ideia, então, é localizar os esconderijos e chegar a eles antes dos aliados russos - que, segundo o filme, pretendiam vender as obras para angariar recursos para pagar indenizações a suas próprias vítimas de guerra.
Enquanto isso, os experts do grupo americano tinham por missão devolver as obras a seus legítimos donos - um esforço que, na vida real, foi realizado no pós-guerra, já que o grupo funcionou até meados de 1951. Sem, no entanto, esgotar a missão. Ainda hoje, há diversas obras-primas desaparecidas, entre elas, trabalhos de mestres como Rafael, Monet e Rodin.
Sem pretender fixar-se demais na lição de história, "Caçadores de Obras-Primas" toma liberdades e injeta humor sempre que possível - como nas relações interpessoais entre os protagonistas. Nem por isso, perde de vista a ideia central da história, de que havia aqui uma série de pessoas que arriscava a própria vida para salvar a arte, um objetivo que não era inteiramente compreendido, ou mesmo bem-visto, pelo resto das tropas de seus próprios países. Nem todos os integrantes do esquadrão, aliás, sobreviveram.
Única mulher do elenco, a australiana Cate Blanchett interpreta a francesa Claire Simone, uma militante da Resistência que vigiou atentamente os saques nazistas no museu onde trabalhava, o Jeu de Paume, em Paris, organizando um detalhado registro das obras que dali foram levadas. Este registro, numa determinada altura, mostra-se indispensável para o trabalho dos comandados de Stokes.
sexta-feira, 20 de dezembro de 2019
MR. MILES
Overbooking: o que nosso correspondente tem a dizer
O sempre adorável Mr. MIles disse, em mensagem enviada à redação, que pretende ver as neves do Brasil durante o inverno. Ele programa uma viagem à São Joaquim para ver o raro fenômeno e para agradar Trashie, sua mascote siberiana. Também vai, um pouco depois, para o refúgio patagônico de seu velho amigo e multiempresário Jaime Trauco Ibañez Cousiño que, embora muito sofisticado, só bebe vinhos em caixas de leite longa vida.
A seguir, a correspondência da semana:
Querido Mr. Miles: acabo de ver, na televisão, a cena chocante em que um médico é arrancado de um avião americano à força. Me deu vontade de ouvir sua opinião imediatamente. Como sei que não é assim, decidi enviar esse email.
Rosa Maria Quintão, por email
Well, my dear: fico orgulhoso por você querer ouvir minha modesta opinião. Vi a cena e fiquei tão inquieto quanto você. Meu único consolo é que, sendo os Estados Unidos uma sociedade tão judicializada e havendo videos das cenas de wrestling vividas pelo passageiro, ele vai processar a aerovia e, without doubt, ganhará pelo menos um Boeing 737-800 para que seus próximos voos tenham, ao menos, seu assento garantido.
However, o overbooking — a prática de vender mais poltronas do que as que existem na aeronave — é legal.
Imoral, mas legal. Se esse tipo de autoritarismo fosse praticado em outras modalidades, haveria grande confusão: espectadores com ingressos numerados em teatros ou cinemas precisariam ter muita sorte; viajantes com hotel reservado iriam acabar no olho da rua; passageiros de trem com assentos marcados terminariam, devastated, nas plataformas das gares.
As empresas aéreas praticam o overbooking porque, in fact, em grande parte dos voos, os passageiros esperados não aparecem. Nesses casos, os viajantes são multados, mas os aviões viajam com alguns lugares vazios — que poderiam, of course, render às companhias alguns — how do you say ?— caraminguás a mais.
Supõe-se que nem todos passageiros estão com pressa ou têm compromissos marcados em seus destinos. Therefore, para evitar reclamações diárias, é comum que, em caso de overbooking, as aéreas oferecem prêmios aos, let's say, "desertores". Ouve-se, com frequência, uma comissária que ofereça dinheiro vivo a quem topar partir no dia seguinte, ou prêmios como promoção à classe executivo and so on. Em caso de voos de longa distância, os prêmios são bastante apetitosos — e vão subindo enquanto ninguém se apresenta. Meu amigo Liam, que ia de Londres para Nairobi com sua mulher e três filhos, for instance, desembarcou a familia inteira quando ganhou cinco novas passagens para o mesmo trecho — garantido-lhe duas férias com safári, ao invés de uma.
Nevertheless, não importa o tamanho do prêmio ou a ausência de premiados. Tirar um passageiro do avião por sorteio é uma decisão deplorável — ainda que os passageiros tivessem acesso às bolinhas e supervisão de uma auditoria independente. O que dizer, darling, de tirá-los à força, tornando-os alvos de uma agressão no mínimo constrangedora?
Aliás, a prática de calar passageiros comprando seu silêncio vem se expandindo. A televisão em frente ao seu assento não funciona? Reclame e receba 100 dólares para aceitar o infortúnio. Sua poltrona não reclina? Mais cem dólares — e não se fala mais no assunto. Já ouvi um amigo de pub contar que sempre torcia para que seu assento fosse brindado com diversas falhas. "Pode ser um negócio rentável.", disse-me ele.
É claro que esse espertinho poderia perfeitamente figurar como funcionário de empresas que, sem qualquer emoção, praticam overbooking. Como me disse, certa vez, a romântica viajante dominicana com quem partilhei momentos agradáveis na ilha de Santorini, "O problema não é sair do avião. É sair do sonho.", comentou, com grande sabedoria.
Fonte: Facebook
quinta-feira, 19 de dezembro de 2019
NÃO TROPECE NA LÍNGUA
DESSUMIR, CONSOANTE (A), PÔDE, SUB
--- Aproveito a oportunidade para perguntar se o correto é dessume-se ou dessome-se. No CD do Aurélio encontrei a segunda forma. Achei estranho. É isso mesmo? G. M. P., Florianópolis/SC
O verbo dessumir significa “deduzir, inferir, concluir por ilação, depreender” e é mais usado pronominalmente no tempo presente:
Dessume-se que o acusado já sabia dos fatos na ocasião do delito.
O dicionário Aurélio manda ver a conjugação do verbo “sumir”, o que não procede. O Houaiss traz a conjugação toda, que no presente do indicativo fica “dessumo, dessumes, dessume, dessumimos, dessumem”. Para reter a forma certa na memória, melhor é pensar em “presume-se”.
--- Gostaria de saber qual é a regência correta: consoante o disposto ou ao disposto...? P. T., Osasco/SP
As duas formas podem ser corretas dependendo do contexto. Como adjetivo, com o sentido de “que consoa, está em consonância e harmonia”, usa-se a preposição a ou com: prática consoante à teoria; o tema está consoante com o público infantil. Entretanto, o emprego mais comum de consoante é como preposição, à maneira de conforme (de acordo com, segundo), neste caso sem o uso de outra preposição:
Consoante Cesar Luiz Pasold, pode haver função sem poder, mas nunca poder sem função.
A cláusula de eleição de foro, consoante disposição do art. 55, § 2º, da Lei 8.666/93, deverá constar da competência do foro da sede da Administração para dirimir questões contratuais.
Consoante o disposto no art. 175 da CRFB, incumbe ao Poder Público a prestação de serviços públicos.
--- Gostaria de saber se a grafia de "pôde" é correta. Caso negativo, como fazer para distinguir o pode do pôde? Obrigado. L. S., Brasília/DF
É correta, sim, quando se refere ao tempo passado. O acento gráfico é usado justamente para distinguir o presente do pretérito. É um dos casos raros de acento diferencial de timbre e que permaneceu no Acordo Ortográfico:
A testemunha diz que não pode enxergar a arma. [agora, neste momento em que lhe mostram a arma do crime]
A testemunha diz que não pôde enxergar a arma. [anteriormente, na ocasião em que testemunhou o delito, por exemplo]
--- Qual o correto: sub-item ou sub item? S. C., Curitiba/PR
Nem um, nem outro. A grafia correta é sem espaço e sem hífen: subitem, assim como subirrigação, subintendente, subaluguel, subemprego, subequatorial, subagência, subalimentação, subagudo, isso porque diante de um substantivo ou adjetivo iniciado por vogal não se usa o hífen depois do prefixo sub (já que não ocorre alteração da pronúncia), mesmo que pareça estranho.
O hífen, no caso de sub, deve ser empregado diante de R ou B, por isso escrevemos sub-reitor, sub-reptício, sub-rogar, sub-rotina, sub-repasse (se fosse escrito junto, a pronúncia ficaria com o mesmo som de ‘sobre’) e sub-base, sub-bloco, sub-bosque, sub-bibliotecário, neste caso para separar as duas consoantes iguais. Diante de H também se usa hífen, conforme Acordo Ortográfico: sub-hepático, sub-hirsuto, sub-habitação. E a 5ª edição do VOLP (2009) traz as variantes subumano e subumanidade para sub-humano e sub-humanidade.
Quando há outras consoantes no início da palavra-base, escreve-se tudo junto: subtotal, subdesenvolvimento, subteto, subsalário, subsecretariado, subseção.
Fonte: www.linguabrasil.com.br
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