sexta-feira, 21 de maio de 2021

TURISMO & PANDEMIA

TURISMO & PANDEMIA
Josimar Melo

Sinto um otimismo no turismo e na hotelaria que é melhor ver com cautela. Premidos pela impossibilidade de viajar para fora, viajantes brasileiros mais abonados estão descobrindo o próprio país

Poucas horas depois de finalizar, pelo computador, meu check-in para a rápida viagem aérea que faria para o Rio de Janeiro nesta última segunda feira, recebo um email da companhia aérea com uma proposta, quase uma súplica: ela propunha me pagar R$ 190 se eu desistisse deste voo e o trocasse por outro. Sinal de que o voo está lotado, possivelmente com overbook (quando a companhia vende mais lugares do que efetivamente tem).

Como assim? Avião lotado? Em plena pandemia?

Sim, constatei no aeroporto. Lotação total na aeronave —na qual, felizmente, toda a movimentação de passageiros se deu de forma organizada e segura.

A pandemia estraçalhou grandes setores da economia. A indústria do turismo entre eles. Aviões parados, hotéis às moscas. Aos primeiros sinais de relaxamento da crise, porém, há uma corrida de descompressão em busca do tempo e das alegrias perdidos.

No Brasil, todos vimos isso no final do ano passado —com resultados, aliás, devastadores, pois o efeito de aglomerações irresponsáveis de uma população sem vacina, incentivadas pelo governo genocida, trouxeram um recrudescimento da tragédia.

Agora, depois de medidas mais severas de fechamento em vários estados, e vacinação avançando um pouco, estamos novamente diante de uma queda nos índices de letalidade, levando à retomada de viagens de trabalho e também de turismo (até mesmo na variedade do polêmico turismo internacional de vacina).

Acontece então a volta de voos lotados. O mesmo acontecendo com hotéis, que, pelos relatos que recebo, passam a ver, com alívio, índices de reservas e filas de espera que muitas vezes superam seus melhores momentos pré-pandemia.

Parece para eles um admirável mundo novo. Mas será?

Ou será um breve soluço antecedendo tempos de instabilidade?

Uma coisa é certa: premidos pela impossibilidade de viajar para fora, os turistas brasileiros mais abonados estão descobrindo o Brasil. E, em muitos casos, gastando aqui o que costumavam gastar em dólares e euros, o que em reais representa valores bem acima da média habitual.

No caso dos hotéis e destinos de negócios, o panorama não é tão róseo; mas os destinos turísticos, e nestes, especialmente os hotéis de luxo, o momento tem sido de comemoração.

Por mais felizes que estejam, porém, é melhor que eles se preparem para uma ressaca inevitável.

A mais terrível hipótese, que não pode ser descartada, é que mais uma vez a euforia com a relativa queda no ímpeto da pandemia, ante a ação nefasta do governo e o lento ritmo da vacinação, estejam nos empurrando para o precipício de uma terceira onda. Que trará novos fechamentos com suas consequências sobre a economia em geral, e também o setor de turismo.

Em uma visão mais otimista, estaríamos, ainda que aos trancos e barrancos, entrando em um período de estabilidade que nos conduziria, lentamente que seja, rumo a uma distensão mais ou menos parecida com a normalidade que já reina em vários países.

Num caso ou em outro, espera-se que sejam tirados necessários aprendizados. Antes de mais nada, esta euforia terá fim logo, logo. Relatos de hoteleiros sobre clientes que passaram a frequentar seus estabelecimentos uma vez por mês ficarão no passado: no melhor cenário, uma vez abertas as fronteiras, esse público abonado e carente de viagens voltará para seus destinos pagos em dólares ou euros. Com a mesma avidez com que, desde já, estão gastando fortunas no insensível turismo de vacina.

Quando a abertura (e o êxodo) acontecerá, não se sabe. O desafio é aproveitar os meses que restam para cativar o público para os atrativos de descobrir o Brasil, seduzi-lo com paisagem, serviço, gastronomia e afeto. Fazer com que o Brasil, que o governo fascistoide transformou num pária ante o mundo, não seja visto assim pelos próprios brasileiros. Não é tarefa fácil, muito menos exclusiva do setor turístico, e passa também pela oposição aberta aos genocidas. Mas que cada um faça sua parte, e o momento é agora.

Fonte: Folha de S. Paulo

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