quarta-feira, 16 de março de 2022

NÃO FAZ SENTIDO CONTAR AS DOSES DA VACINA

NÃO FAZ SENTIDO CONTAR AS DOSES DA VACINA
Pedro Hallal

A contagem de doses confunde o público e alimenta teorias negacionistas

Em breve, o Brasil iniciará mais uma de suas campanhas anuais de vacinação contra a gripe. Como nos anos anteriores, milhões de brasileiros visitarão o Sistema Único de Saúde para protegerem a si próprios e aos outros. A cultura vacinal é um dos patrimônios do nosso país.

Mas uma coisa é importante de ser destacada:

Nenhum brasileiro dirá: "tomei a minha vigésima terceira dose da vacina contra a gripe". Ao contrário, ele dirá: "tomei a minha vacina contra a gripe de 2022".

É exatamente essa lógica que precisamos adotar na vacinação contra a Covid-19. A contagem de doses, atualmente em uso, confunde o público e alimenta teorias negacionistas. Quem nunca recebeu em grupo de WhatsApp aquela imagem negacionista questionando a efetividade das vacinas em função de algumas pessoas já estarem tomando a quarta dose?

A verdade é que as vacinas contra Covid-19 são um caso de sucesso estrondoso, mas precisamos aprimorar a comunicação.


Sucesso estrondoso porque, mesmo criadas em tempo recorde, apresentam indicadores de segurança e eficácia dos melhores já vistos na história da saúde pública.

Sucesso estrondoso porque, antes da chegada da variante ômicron, eram raros os casos de infecção entre pessoas vacinadas.

Sucesso estrondoso porque, mesmo depois da chegada da variante ômicron, os vacinados apresentam risco de mortalidade, hospitalização e caso grave muitas vezes menor do que os não vacinados.

Sucesso estrondoso porque, em nível global, a vacina contra a Covid-19 já salvou milhões de vidas.

Apesar de todo o sucesso da vacina contra a Covid-19, obviamente que a comunicação continua sendo importante. A cruzada negacionista contra a vacina, liderada no Brasil pelo próprio presidente, busca, diariamente, notícias para colocar em dúvida a eficácia e a segurança das vacinas. Alguns dos negacionistas mais malucos (incrivelmente alguns deles em cargos importantes) parecem torcer até para a morte de crianças vacinadas, para "comprovar" suas teorias da conspiração de que a vacina não é segura.

A verdade é que qualquer pai e mãe, que realmente pense na saúde dos seus filhos, os vacinam. Isso porque o risco de um caso grave e até óbito por Covid-19 é infinitamente superior ao risco de uma complicação decorrente da vacina. O pai e a mãe que decidem proibir a vacinação de seus filhos, na verdade, estão tomando uma decisão política, às custas da saúde das crianças.

Mas para que toda a engrenagem funcione e a vacinação continue sendo um sucesso no Brasil, precisamos melhorar a nossa comunicação. E nesse momento a prioridade é parar de contar as doses da vacina, e aceitar que, assim como várias outras vacinas, a da Covid-19 será tomada de tempos em tempos, quando necessário.

Ainda não há uma resposta definitiva se a vacina contra a Covid-19 será tomada uma ou duas vezes por ano, ou até em intervalos maiores. Isso depende da duração da imunidade conferida pela vacina e do quanto o vírus está circulando. Os melhores estudos indicam que a imunidade conferida pela vacina, num cenário de ampla circulação do vírus, é de cerca de seis meses.

Além disso, nesse momento, em que ainda estamos vivendo a pandemia, é provável que tenhamos que tomar mais doses do que num futuro em que a circulação do vírus será mais restrita. Isso é normal na saúde pública. O que não é normal é ficar contando doses de vacina e alimentando teorias negacionistas de que as múltiplas doses comprovam que a vacina não funciona.

Precisamos que a comunicação sobre a vacina seja tão efetiva quanto a própria vacina.

Fonte: Folha de S. Paulo

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