terça-feira, 13 de julho de 2021

ROMANCE FORENSE

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Charge: Gerson Kauer

Os deveres dos nubentes

A juíza recém empossada dá uma escapada da sala de audiências - cheia de gente - e vai a uma saleta ao lado para celebrar a cerimônia civil de um casamento. Ela está a suprir a inexistência, na comarca, de tabelião e de juiz de paz.

Estão presentes apenas os familiares, todos gente simples.

Inicialmente a magistrada tergiversa sobre a importância do matrimônio, dirigindo-se a um casal, de meia idade, que está de pé à sua frente, de mãos dadas.

Pouco depois, o servidor cartorário gesticula discretamente. A jovem magistrada faz um sinal indicando que ele esperasse. E continua a oratória, enumerando os deveres dos cônjuges. No final, pontifica, dirigindo-se ao noivo:

- Senhor João Francisco, aceita casar com a senhora Maria Jaguaribe?

O homem apenas olha para a juíza. Imaginando que o noivo estivesse nervoso, ela repete com voz mais impositiva:

- Senhor João Francisco, aceita casar com a senhora Maria?

O noivo permanece silente. Apenas olha em torno. A mulher também nada diz.

E a magistrada se intriga cada vez mais. Nisso, o servidor recomeça a gesticulação, como a insistir em uma brecha para falar.

A juíza ignora a conjunção e repete:

- Senhor João Francisco da Silva, me responda se aceita ou não casar hoje. Há algum problema?

O nubente parece contrariado, sem nada dizer. A noiva, quietíssima.

Ambos apenas balbuciam algo ininteligível, enquanto olham em direção ao serventuário, que novamente pede um aparte.

- O que é desta vez, senhor escrivão?

- Doutora, me desculpe. É que a senhora não me deu tempo para lhe informar que os noivos são surdos-mudos!
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O Romance Forense de hoje foi adaptado a partir de um relato feito no blog do juiz estadual (RN) Rosivaldo Toscano Júnior.

Fonte: www.espacovital.com.br

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