Uns chamam de cantina, outros chamam de bar e outros ainda chamam de sala do cafezinho. Para este relato eu prefiro a última denominação.
Pois na sala do cafezinho da Faculdade de Direito, espaço pequeno, por sinal, haviam três minúsculas mesas e numa delas, quase sempre havia um tabuleiro e as peças para quem quisesse jogar dama ou xadrez.
Até hoje não sei jogar xadrez e acho que não sei jogar damas pois nunca ganhei de ninguém, nem mesmo quando jogávamos de modo inverso, ou seja, quem perde ganha.
Em tais ocasiões, o jogo consistia em jogar para perder. Como eu era um perdedor contumaz pensava que seria a minha salvação. Ledo engano. Derrotava o adversário com a decisiva e consciente colaboração do mesmo. Ou seja, mesmo ganhando eu perdia.
Mas era o tipo de brincadeira que tinha suas compensações. Faço um breve parêntesis para um melhor entendimento do que seria a tal brincadeira.
Na faculdade haviam vários aficcionados daqueles jogos. Da minha turma, talvez o mais fanático era o Guido. Perdia o horário da aula mas não perdia a oportunidade de jogar.
Quem chegasse mais cedo à sala do cafezinho se adonava do tabuleiro e seguia jogando. A rigor não haviam regras para a cessão do lugar para outros jogadores. A mais respeitada era o perdedor ceder o lugar ao pretendente há mais tempo na espera.
O jogo de damas é muito rápido e bastante óbvio. Quando o Guido estava por perto, os contendores simulavam muito raciocínio antes da próxima jogada, mesmo que o movimento fosse óbvio.
Tanta obviedade e tanta demora na decisão deixava o Guido nervoso a ponto de muitas vezes ele próprio realizar a jogada no lugar daquele que estava titubeando. Muitas vezes a explicação dos jogadores com aquele interferência indevida do Guido é que a modalidade daquela sessão era do tipo "quem ganha perde" e o Guido sempre jogava para ganhar.
E aí acabava tudo. Alguns simulavam profunda contrariedade e coisas do gênero. Mas aquilo tudo era ensaiado, combinado. A questão era sempre saber o quanto o Guido aguentaria sem um pitaco qualquer.
Mas o hilário de tudo é que nas semanas seguintes a cena se repetiria e todos viveram felizes para sempre.
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