domingo, 27 de julho de 2025

NÓS E A MÁFIA

Ninguém duvida da existência da Máfia. O cinema encarregou-se de divulgá-la ao mundo e identificá-la com o sul da Itália, de modo especial com a Sicília. O estigma talvez contribua para que a ilha não fosse um destino turístico tão procurado como outros pela Europa em geral e pela Itália em particular. Ou por medo da máfia ou por ignorância quanto ao seu modus operandi, muitas pessoas deixam de conhecer lugares maravilhosos e de saborear a culinária mediterrânea. Não foi o nosso caso. Formamos um grupo que desejava conhecer outras maravilhas italianas, além daqueles tradicionais destinos turísticos como Alpes, Veneza, Roma, Toscana, etc. A partir de Roma iríamos para o sul, iríamos conhecer a magnífica costiera Amalfitana, a Ilha de Capri, Nápoles com seu trânsito caótico e a quase totalidade de automóveis com pequenos amassamentos, além de degustar um saboroso café no Gambrinus. Embora à distância, teríamos uma visão do majestoso Vesúvio e iríamos visitar as ruínas de Pompéia por ele destruída. Tudo isto e muito mais. Nosso motorista, um italiano trentino, ao ser indagado acerca da máfia, nos tranquilizou e ao mesmo tempo nos explicou a sua forma de agir nos dando um exemplo. Um comerciante pode receber um telefonema de alguém dizendo que determinada pessoa irá se apresentar para trabalhar. Não adianta dizer que não está precisando de empregados pois a voz do outro lado da linha afirma que ao contrário, está precisando sim de mais empregados. Em contrapartida, o comerciante experimenta incremento em seus negócios sem saber das causas. Outra moeda de troca se estabelece nos impostos onde o comerciante recolhe oficialmente um valor simbólico e outra parte substancial é paga aos seus protetores. No passado a fórmula funcionou às mil maravilhas mas aos poucos acabou perdendo espaço para a modernização do mundo virtual. A comprovação do que nos foi relatado seria quase que imediata. Na região de Sorrento nos hospedamos num hotel na cidade de Castelamare di Tabia, onde dormiríamos três (3) noites. O acesso aos nossos apartamentos era difícil devido ao fato de o hotel ter sido edificado num local onde a topografia não ajudava em nada. Tivemos que arrastar nossas malas morro acima e antes de chegar aos nossos apartamentos trocamos de elevador duas vezes. O nosso consolo era que para irmos embora tudo seria morro abaixo, quando todo santo ajuda como diz o refrão daquela marchinha de carnaval. Tão logo nos hospedamos nos reunimos no hall de entrada onde o nosso motorista destacava a visível presença de um maior número de funcionários em comparação com os outros hotéis por onde havíamos passado anteriormente. Mediante tal constatação, justificava os efeitos provocados pela máfia também naquele estabelecimento. De resto, nenhuma outra evidência, ao menos para nós, indicava que por ali existia um governo paralelo. Cumprimos o nosso roteiro de visitas daquele dia pela região e ao chegarmos ao hotel para a nossa segunda noite, a nossa guia foi chamada à gerência do hotel. Depois do jantar, visivelmente contrariada, ela nos reuniu para nos comunicar o motivo do inusitado convite. Ela havia recebido um pedido para que nós desocupassemos os nossos apartamentos na manhã seguinte, pois aconteceria uma festa de casamento e o número de convidados que permaneceriam no hotel superava o de reservas realizadas. Em princípio, a lembrança das dificuldades da chegada até os nossos aposentos, fez com que não aceitássemos a proposta. Porém, nossa guia não havia terminado a preleção. O hotel assumiria toda a tarefa de transferir as nossas bagagens e nos oferecia um hotel próximo, classificado com quatro (4) estrelas. Ainda assim relutamos, pois a única garantia de que tudo seria cumprido à risca era a palavra do gerente. Foi quando o nosso motorista, conhecedor das leis daquele mundo à parte, disse-nos que poderíamos aceitar a proposta sem nenhuma preocupação pois alí a palavra valia mais do que qualquer documento. Bem analisado e ponderado o pedido, decidimos aceitar, o que implicava em deixar as nossas bagagens prontas na manhã seguinte para serem transferidas ao novo hotel. Saímos para mais um roteiro e na volta, todos nós tínhamos a mesma preocupação, qual seja, a de que as malas estavam realmente no novo hotel e que o mesmo oferecesse condições iguais ou melhores às que tínhamos. Seria a última noite na Itália e ninguém desejava finalizar a viagem, até então magnífica, com surpresas desagradáveis. O lugar onde ficava o hotel chamava-se Vico Equense, denominação totalmente estranha e desconhecida, o que nos deixava com um pé atrás. Finalmente, ao chegarmos no nosso novo paradouro, não fosse o Mediterrâneo aos fundos, diria que era uma roubada. Da rua, vendo a fachada do hotel, não havia mais do que um pavimento. Porém, quando chegamos na recepção, a surpresa não poderia ter sido melhor. O hotel, com seus quatorze (14) pavimentos, fora construído junto ao penhasco. Não subiríamos para os nossos aposentos, mas sim, desceríamos. Entender a lógica dos elevadores foi um pouco complicado no início mas depois nos acostumamos e tudo ficou dentro da normalidade. O pavimento térreo, no caso, dava saída para o mar onde havia toda uma estrutura para banhistas, o que foi aproveitado por dois colegas do grupo. Enquanto isso, ainda tivemos tempo para um passeio pela pequena cidade, onde havia, segundo nos disseram, um estabelecimento que vendia a melhor pasta de toda a Itália. Não foi difícil localizá-lo. O mais difícil foi encontrar espaço nas nossas malas para acondicionar o volume extra de compras. De volta ao Brasil pudemos comprovar a qualidade do produto, evidentemente sem a competência e o conhecimento necessário para afirmar que era a melhor pasta italiana. Nosso paladar, no entanto, nos deu a certeza de estarmos diante de um produto de altíssima qualidade e com o desejo de retornar para mais aquisições. De volta ao hotel, depois de um banho restaurador, nos preparamos para o jantar. O restaurante proporcionava uma vista magnífica para o Mediterrâneo. Para completar o presente que nos foi proporcionado, a natureza nos brindou com um pôr-do-sol de tirar o fôlego.

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