domingo, 25 de junho de 2023

LINHAS CRUZADAS

Fernando Albrecht
Nos tempos do telefone fixo de disco, o serviço era uma droga, na maior parte do tempo. Conversas cruzadas eram comuns. Você ouvia sem querer ou sem-querer-querendo até casais trocando juras de amor e promessas dessa ou daquela posição na cama. Não necessariamente nesta ordem.

Em empresas, às vezes o sistema PABX ficava sobrecarregado. Então, durava uma eternidade até conseguir linha. O mais exasperante depois dessa demora toda era o número discado dar sinal de ocupado.

Quando eu era bancário, uma das minhas funções era ligar para quem não pagou seu papagaio. Tinha suas manhas, e, recém-chegado a Porto Alegre, tive como instrutor um sujeito fantástico chamado Dalmir.

O cara era um pândego. Quanto não tinha alguém perto para aprontar, aprontava ele mesmo. Era especialista em imitar políticos ou colegas de trabalho.

No treinamento, eu ficava ouvindo a conversa com a orelha perto da orelha dele. E aí veio uma linha cruzada daquelas, conversa de namorados.

– Tu me amas?

– De paixão, benhê.

– Tô louquinho pra te ver. Posso ir aí?

– Tá… mas cuidado. Minha mãe marca de cima. Tem que ser no maior respeito.

Foi aí que o Dalmir entrou na conversa imitando perfeitamente a voz do namorado.

– Mas me espera sem calcinha, tá? Nuinha, só aquele vestidinho por cima…

E ficou quieto. Dali em diante houve um silêncio estupefato do casal.

– Podemos ir para a cozinha, quero passar a mão nessas pernas.

Os dois falaram ao mesmo tempo.

– O quê? Mas que é isso meu bem?

– Mas eu não falei nada, não sei como alguém entrou na conversa.

O cara deve estar dando explicação até hoje.

Fonte: https://fernandoalbrecht.blog.br

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