quarta-feira, 8 de outubro de 2025

CAMINHANDO EM PINHALZINHO

Sempre tive um ótimo relacionamento com os membros do Ministério Público, de sorte que nominando-os estarei correndo o risco de omitir algum nome. Todavia, em homenagem a todos eles, vou falar do João Alberto por diversas razões, a começar pelo fato de ter sido o primeiro Promotor de Justiça com quem trabalhei no início de minha carreira de magistrado na Comarca de Pinhalzinho. Éramos vizinhos e nossas casas não eram separadas por cercas divisórias. E por fim, o mais importante de tudo, é que o João Alberto sempre acolheu em sua residência em Chapecó, todos os juízes e promotores que atuavam no oeste, principalmente os mais jovens. Posso afirmar sem qualquer receio do exagero, que ele era a nossa tábua de salvação em qualquer necessidade. E sempre fomos atendidos com a mesma fidalguia. Para mim foi uma dádiva ter cruzado o meu caminho com a figura singular do João Alberto. Ele ingressara na carreira do Ministério Público poucos meses antes que eu, pelo que, nossas dificuldades eram em tudo semelhantes. O João Alberto, solteiro convicto, tinha hábitos rígidos. Ele próprio fazia as compras no supermercado enquanto que a Maria, sua governanta, fazia pratos deliciosos. Por conta disto, ele zelava pela saúde, de forma invejável. Frequentava academia e sauna em Chapecó e semestralmente submetia-se a uma bateria de exames médicos. Era comedido à mesa. Comida na porção exata e bebida - vinho de preferência - apenas nas refeições e ainda assim sem qualquer exagero. Diariamente empreendia suas caminhadas como forma de manter sua saúde em ordem. Logo nos primeiros dias de contato, percebi que ao final do expediente ele saia a caminhar pela cidade, onde as opções não eram boas, posto que a pavimentação das ruas nas cidades do oeste, quando ainda não conheciam asfalto, era feita de pedras irregulares, tornando as caminhadas um exercício nada agradável. Mesmo assim ele caminhava. Certo dia aceitei o convite para acompanhá-lo numa dessas caminhadas. Devidamente paramentados - bermuda, tênis e óculos escuros, já que era verão. Rodamos por aproximadamente uma hora, evitando o centro da cidade e optando por caminhar por um bairro novo, onde, inclusive, localizava-se a Igreja Matriz. Depois, retornamos às nossas residências para um banho reconfortante. Nas primeiras horas da manhã seguinte, recebi em meu gabinete a Oficial do Registro de Imóveis, a qual, toda preocupada, fez um relato que depois seria motivo de muitas gargalhadas. Segundo ela, uma vizinha havia notado a presença de dois homens suspeitos rondando a sua casa. Descreveu os prováveis meliantes com detalhes precisos - altura, idade aproximada, um calvo e de barba, outro moreno e magro, e assim por diante. Ouvi atentamente o relato da Dra. Janete e como não conhecia ainda todos os serventuários pensei em pedir a opinião do Dr. João Alberto. Eu estava na Comarca há apenas uma semana enquanto ele já faziam três meses. Nossos gabinetes eram contíguos, inclusive com uma porta de comunicação interna. A meu pedido, o Dr. João Alberto, cachimbo na mão, que era um dos seus hobbies, ouviu atentamente a repetição do relato da Dra. Janete, e indagou da mesma onde ficava a sua residência.

- Próximo à igreja, respondeu.

- Dra. Janete - disse o Dr. João Alberto - imagine o juiz e o promotor aqui presentes, sem paletó e gravata, antes, trajando bermudas, camisetas, calçando tênis e usando óculos de sol, a caminhar pelas proximidades da sua casa... Levantariam alguma suspeita?

O rubor das faces da Dra. Janete foi imediato.

Seguiu-se uma sonora gargalhada do Dr. João Alberto e deu-se o caso por encerrado.

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