quarta-feira, 22 de outubro de 2025

O PINTOR E A CAMIONETE

Ele era pintor. Não tenho certeza mas morava no Real Hotel. Choferiava um veículo que na nossa infância denominávamos de "fordeco". Era do tipo camionete, ano 1929 ou próximo, desses que se vê assistindo os filmes dos inesquecíveis O Gordo e o Magro. 

Como fosse o tipo de veículo que pelas suas características todo mundo sabia pertencer ao pintor, que no caso, era conhecido por Gelatti. Essa "marca registrada" que era a própria camionete, era uma espécie de seguro, uma garantia de que nunca seria furtada. Ninguém se atreveria a furtar um bem que todos sabiam pertencer ao pintor Gelatti. 

Como o veículo era usado para transportar todo o aparato de pincéis, tintas e escadas para o labor do Gelatti, o mesmo era todo aberto e não exibia nenhum aparato de segurança. O feliz proprietário também colaborava para essa garantia. Era um sujeito folclórico e por onde passava sempre havia conversa em volume acima do normal. Morando no Real Hotel, era assíduo frequentador das mesas de feltro verde dos clubes próximos. 

Naqueles tempos estacionamento não era problema. Sempre haviam vagas disponíveis nas proximidades dos dois estabelecimentos e para facilitar a vida dos motoristas, o estacionamento era no sentido oblíquo. 

Tudo seria um mar de rosas se não existissem os eternos aprontadores. Vez por outra três ou quatro garotões frequentadores daquelas imediações "furtavam" a camionete indo estacioná-la cerca de um ou dois quarteirões do local original. Quando o Gelatti saia do carteado ou de manhã saia do hotel para trabalhar tinha a desagradável surpresa de não encontrar o seu instrumento de trabalho. Bestemas e mais bestemas. 

A sacanagem se repetia com tal intensidade que o Gelatti resolveu dar um basta naquela brincadeira. Comprou uma corrente com cadeado e estacionou a camionete junto a um poste de eletricidade onde aprisionou a mesma. Os malandros, assim que chegaram para mais uma aventura, dando de cara com aquelas correntes, ficaram um tanto frustrados no seu intento, mas… alguém teve a brilhante idéia de conseguir outra corrente com outro cadeado e fizeram o mesmo que o Gelatti havia feito. Acorrentaram a camionete no mesmo poste. 

Ao sair para o trabalho, vendo a sua camionete no lugar onde a deixara na noite anterior, ele ficou satisfeito. O sentimento de vitória durou pouco, só alguns minutos para dizer a verdade. Sentindo-se o feiticeiro contra o qual havia se virado o próprio feitiço, de sua boca saíram bestemas e mais bestemas. 

Os autores? Desconheço, mas desconfio. Quem me relatou os fatos foi o Alfredinho. Tendo em vista o seu passado aprontão… 

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