sexta-feira, 13 de outubro de 2023

A PSICOLOGIA DO TROTE

Hélio Schwartsman

Experimento mostra que quem passa por iniciação mais dura gosta mais do grupo a que se juntou

A história de alunos de medicina da Unisa exibindo seus "glutei maximi" e outras partes pudendas dá o que pensar. Por que trotes e outros ritos iniciáticos, por vezes ofensivos ou até violentos, sobrevivem aos esforços para eliminá-los?

A psicologia humana, que já é complicada, fica ainda mais exuberante quando lidamos com contradições. Para entender melhor a dissonância cognitiva, Elliot Aronson e Judson Mills submeteram estudantes de Stanford dos anos 1950 a um experimento seminal. Uma parte dos voluntários passaria por um rito iniciático severo. Teriam de ler em voz alta para o pesquisador passagens sexualmente picantes de "O Amante de Lady Chatterley" (nos anos 1950, isso passava por um "batismo" severo; hoje o teste seria proibido, e o experimentador, cancelado). Outra parte se submeteria ao rito leve, que era ler palavras de cunho sexual de um dicionário.

Depois da iniciação, as duas coortes ouviram uma gravação, que, foi-lhes dito, era uma discussão entre membros do grupo ao qual se juntariam. Os pesquisadores capricharam em produzir algo realmente chato. Na fita, pessoas que admitiam não ter se preparado para a tarefa discutiam, de forma hesitante, características sexuais secundárias de pássaros.

Os estudantes que passaram pela iniciação fraca não se deixaram enganar. Classificaram o debate como aborrecido e inútil. Mas os voluntários que sofreram mais para ser admitidos disseram que a discussão era interessante e estimulante, e os membros do grupo, atraentes e afiados.

O experimento, reproduzido com sucesso ao longo das décadas, traz alguns elementos para a resposta à nossa pergunta. A maior severidade do rito de entrada está associada a uma maior apreciação do grupo e a uma redução do senso crítico em relação a suas práticas. É uma dinâmica difícil de quebrar, já que as próprias vítimas costumam aprovar o tratamento que receberam e tenderão a reproduzi-lo.

Fonte: Folha de S.Paulo

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