quarta-feira, 26 de julho de 2023

CAPAS QUE NOS FAZIAM BABAR

Ruy Castro

George Lois criou algumas das melhores capas de revista da história

Para quem passou boa parte da vida em Redações de revistas — Manchete, Fatos e Fotos, IstoÉ, Status, Playboy, Veja —, habituei-me a viver as horas de maior angústia e excitação do trabalho: as reuniões para a escolha da capa. As revistas semanais vivem da atualidade, donde a capa é quase sempre o assunto em voga. Já as mensais exigem elucubração, ousadia, criatividade — é um trabalho de equipe, com todo mundo em busca de uma ideia original, ousada e criativa. O problema é a interferência dos patrões e a falta de dinheiro.

Daí que, em todas as revistas em que trabalhei, babávamos com as capas da Esquire, a revista mensal americana fundada em 1933 por Arnold Gingrich e dirigida a um leitor que fazia ótimo juízo de si mesmo: culto, liberal, bem sucedido, másculo (sem exageros) e sensível.

Até pelo menos 1977, Esquire foi um show de artigos, reportagens, ficção, fotos, ilustrações. Seus colaboradores eram gente como Hemingway, Fitzgerald, Aldous Huxley, Truman Capote, John Updike e até Leon Trótski, com crítica de livros por Dorothy Parker, de cinema por Peter Bogdanovich e outros luxos. Mas nada superou suas capas dos anos 1960 e 1970, muitas delas por George Lois.

Lois criou capas antológicas: Muhammad Ali, condenado por recusar-se a lutar no Vietnã, flechado como são Sebastião; o machão Burt Reynolds olhando para baixo apreensivo — era uma reportagem sobre impotência; Andy Warhol afogando-se numa lata de sopa Campbell; o sinistro Richard Nixon sendo maquiado com batom e rouge; Norman Mailer fantasiado de King Kong e segurando em sua manopla a feminista Germaine Greer. Às vezes, por causa de suas capas, anunciantes cancelavam contratos e leitores, assinaturas. Mas George Lois era intocável na Esquire.

Lois morreu na semana passada em Nova York, aos 91 anos. O incrível é que não era jornalista nem capista profissional. Era publicitário.

Fonte: Folha de S. Paulo

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