terça-feira, 6 de maio de 2025

O TEMPO DE TITE

Fabrício Carpinejar

Tite deu um tempo para si:
— Antes de ser técnico, sou humano.

O ex-treinador da seleção, aos 63 anos, anunciou sua retirada por período indeterminado para cuidar da saúde mental e física. O susto da arritmia cardíaca após retornar de um confronto da Libertadores na Bolívia, em agosto de 2024, comandando o Flamengo na época, contribuiu para a reviravolta profissional.
Num esporte em que a resiliência atinge os extremos da autoviolência, em que não se desiste, o que Tite fez é uma atitude corajosa. É uma aula de civilidade terapêutica para o futebol, mostrando a importância da pausa.

Torna-se um ícone masculino, seguindo a lucidez de Simone Biles: reconhece suas fronteiras e opta por um intervalo, mesmo sob os holofotes e pressões, mesmo com convites irrecusáveis, para preservar os seus valores.

Essa resolução do Tite rompe com um padrão cultural entre os homens: o da resistência silenciosa a qualquer preço, da mania de “aguentar tudo” e jamais pedir ajuda, da negação da vulnerabilidade. Ele vinha dizendo que não suportava mais o ritmo. Se continuasse assim, subestimando os sinais de alerta, poderia morrer sentado numa casamata, ou sucumbir pela depressão ou ansiedade num quarto de hotel.

Como Simone Biles na Olimpíada de Tóquio (2021), que abandonou as provas por sérias questões emocionais e foi duramente criticada por declinar de futuras medalhas de ouro, Tite assume o que parece uma fraqueza, mas é a força maior da franqueza: a valentia de parar simbolicamente o seu cargo para retomar a vida e reencontrar a sua inspiração.

Treinadores são tratados como máquinas, submetidos a experiências assustadoras, numa imprevisibilidade doméstica, sempre prestes a ser demitidos, sempre trocando de cidade e de clube, levando as famílias de roldão, matriculando e rematriculando suas crianças no vaivém das escolas.

As glórias duram pouco. As vaias, essas sim, sufocam.

Técnico já nasce com a Síndrome de Burnout. A tensão é a sua rotina: do treinamento para a concentração e daí para a partida, num labirinto interminável.

Tite pensa que está se salvando, mas na verdade está salvando vários de seus colegas a partir de seu exemplo.

Fonte: Facebook

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