sábado, 17 de maio de 2025

ROMANCE FORENSE

Charge de Gerson Kauer
Romântico à moda antiga

O operador jurídico aposentado, 63 de idade, viúvo, contratou uma serviçal com as melhores intenções empregatícias de quem queria uma casa bem arrumada e refeições nas horas certas.

Talvez pela solidão em que vivia – embora a abissal diferença cultural – ele começou a enxergar a doméstica, 39 de idade, com outros olhos.

Não demorou, passou para a fase dos bilhetinhos; primeiro protocolares (“o almoço estava delicioso”); depois afetivos (“meu anjo”; “minha rainha”; “linda mulher que enriquece meus dias”; “teu homem de coração vazio”).

E, afinal, partiu para as pitadas sexuais: “tens belas nádegas”, “imagino a firmeza dos teus seios”.

A serviçal diz que não acedeu jamais e, dois meses depois, foi demitida, recebendo todas as parcelas rescisórias certíssimas. Mas – com o apoio de um novel advogado – ela foi ao juízo trabalhista buscar reparação por dano moral decorrente de assédio sexual.

A prova foi apenas a documental.

O juiz observou que, em uma de suas mensagens, o empregador referira ter “adorado o teu bilhete de ontem; é um sinal de que o nosso caso pode estar progredindo”.

Interpretando esse trecho manuscrito, o magistrado concluiu que “havia uma certa reciprocidade atrativa no relacionamento, o que já é suficiente para descaracterizar o alegado assédio”.

Conforme a sentença, “ficou claro que, em algum momento, houve – pela empregada - aceitação da proposta patronal, especialmente quando ele demonstra consideração para com a empregada e seu filho menor, a quem mandava presentes”.

O juiz também definiu que o empregador era “um romântico à moda antiga”, que apenas tentou declarar desejo e carinho à reclamante, “mesmo com o risco de se passar por ridículo em suas mensagens amorosas, nas quais não usou termos ofensivos ou que demonstrassem sua superioridade na relação de emprego”.

Na conclusão, o julgador escreveu que “enquadrar o sentimento e as investidas românticas do reclamado como assédio sexual seria uma pena demasiadamente pesada, pois, se assim fosse, todos os homens teriam que fugir das mulheres para evitar problemas com a Justiça”.

Não houve recurso para o TRT.

Com o trânsito em julgado, há quem diga que reclamante e reclamada conciliaram extrajudicialmente. Após um pagamento de R$ 3 mil, eles se cumprimentaram cordialmente e cada um foi para seu lado.

Fonte: www.espacovital.com.br

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