quinta-feira, 7 de agosto de 2025

DEUS E O DEMÔNIO

Carlos Heitor Cony

Não sei se é verdade, mas sempre ouvi dizer que Dom Pedro 2º, ao experimentar, na companhia de Graham Bell, o primeiro telefone, deu um grito horrorizado: "Tem um homenzinho dentro deste troço". De maneira geral, todos os avanços tecnológicos parecem coisas demoníacas.

No interior do Brasil, as primeiras locomotivas que passavam pelos campos faziam a população se persignar, o barulho infernal, as fagulhas que saíam da chaminé e que freqüentemente incendiavam os canaviais, tudo parecia coisa do demônio.

Pulo do telefone e das locomotivas para a internet, a criação mais estupenda da tecnologia desde que inventaram a roda. Pode ser encarada, ao menos no estágio em que se encontra, uma criação divina e diabólica ao mesmo tempo. Divina porque aproxima os homens de forma barata e imediata, cria condições de progresso e bem estar que não se podia imaginar até recentemente.

Tem também seu lado diabólico. Pode fazer estragos coletivos e individuais, estamos ainda na fase das cavernas, na pré-história da comunicação eletrônica, fica difícil prever para que lado ela penderá. Num primeiro estágio, ela pareceu abrir para qualquer um a possibilidade de melhor se informar e melhor se comunicar. Mas pouco a pouco, de tal maneira ganha sofisticação, que breve será um instrumento dos mais fortes, dos mais sábios em operar seus mistérios e possibilidades.

Pelo mundo todo, há uma geração jovem, pós-informática, que poderá deter o monopólio do novo instrumento que a técnica ofereceu à humanidade. O Big Brother imaginado por George Orwell baseava-se numa força tecnológica inexistente no tempo em que o romance foi escrito.

Hoje, esta força tecnológica existe. O problema é saber se ela será manobrada por Deus ou pelo Demônio.

Fonte: Folha de S.Paulo - 12/04/2005

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