quarta-feira, 3 de novembro de 2021

OS PIANOS E VIOLÕES PERDIDOS

OS PIANOS E VIOLÕES PERDIDOS
Ruy Castro

Para onde terão ido os instrumentos dos virtuoses que fizeram a história da música brasileira?

Há dias (27/9), perguntando-me para onde teriam ido os instrumentos de grandes músicos brasileiros, referi-me aos violões de Garoto, à gaita de Edu e ao violino de Fafá Lemos. O destino dos dois últimos continua ignorado, mas tive o prazer de saber que, graças a seu biógrafo Jorge Mello, o violão e o banjo de Garoto acabam de ser doados por sua família ao Museu da Imagem e do Som, do Rio. Farão companhia a outras preciosidades sob a guarda do MIS.

Lá estão o piano-armário de Ernesto Nazareth, de onde saíram os tangos, polcas e valsas que fundaram a moderna música brasileira em 1900; o cavaquinho de Waldir Azevedo, berço do baião “Delicado”, Top Ten da revista Cash Box em 1950; os sublimes clarinete e sax-tenor de Abel Ferreira; o bandolim de Jacob; o violão de Raphael Rabello; e o primeiro rádio de pilha visto no Brasil, trazido dos EUA por Carmen Miranda para Almirante em 1940. É muito —mas também é pouco, diante do que não sabemos que fim levou.

Os pianos de Tom Jobim estão com seus herdeiros, mas e o de Newton Mendonça, seu parceiro em “Desafinado”? Os violões de João Gilberto estão sob disputa judicial, mas com quem ficaram os de Silvio Caldas, Lucio Alves e Nelson Cavaquinho? E as flautas de Benedito Lacerda e Altamiro Carrilho? A zabumba de Jackson do Pandeiro? A batuta da maestrina Chiquinha Gonzaga?

A farda com que Blackout cantava “O General da Banda” nos carnavais dos anos 50? Uma das caixinhas de fósforos com que Cyro Monteiro se acompanhava ao cantar “Falsa Baiana”? O molho de chaves com que Orlandivo balançava “Samba Blim”? E o dicionário de rimas de Noel Rosa, todo anotado, que Marília Baptista, sua cantora, me mostrou em 1967?

Milton Banana, inventor da batida da bossa nova na bateria, já não tinha bateria em casa ao morrer, em 1999. Dez anos depois, um de seus amigos me presenteou com uma baqueta que teria sido dele. Não discuti. Aceitei comovido.

Fonte: Folha de S. Paulo

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