quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

MEDIOCRIDADE EM UM PAÍS DE EDUCAÇÃO MEDÍOCRE

MEDIOCRIDADE EM UM PAÍS DE EDUCAÇÃO MEDÍOCRE
Por Cristiano das Neves Bodart

Certamente você não gosta de ser chamado de medíocre, isso por possuir, tal palavra, uma conotação pejorativa. Mas será que, em relação à educação, você não é medíocre? Já se fez essa pergunta?

Ser medíocre é ser mediano; é estar na média. É estar entre o bom e o ruim. Em outras palavras, é não estar entre os melhores, ainda que também não entre os piores. No caso específico da educação, ser medíocre em um país medíocre, como o Brasil, é ainda pior. Isso é muito sério! A Educação pública brasileira parece ter por objetivo produzir pessoas medíocres em um sistema já medíocre. Observando as constantes mudanças no sistema educacional público de ensino básico, notaremos facilmente um plano medíocre para reproduzir mediocridade. Os exemplos são diversos: níveis de prova, seleção de conteúdos, capacitação de professores, salas de aula cheias, excessos de trabalhos simplistas aplicados aos estudantes, etc.

No caso das provas notamos, digo por experiência de causa, que é praticamente proibido cobrar do aluno o que o professor não falou em sala de aula em relação ao conteúdo dado, o que leva à mediocridade. O professor ao ter que se expressar para 40 alunos, “nivela por baixo” o conteúdo da aula para que todos, ou quase todos, entendam. Transmite assim um conteúdo já medíocrizado. Os alunos, por sua vez, precisam assimilar apenas parte desse conteúdo (às vezes 70%, outras 50%) para ser aprovado naquele mediocrizado conteúdo; isso quando não é orientado que ele participe da Festa de São João, dançando na quadrilha, por exemplo. Esse ato o garantirá mais 20% da nota na prova, precisando apenas aprender 30% do conteúdo mediocrizado pelo professor. Pronto! Aprovado mais um medíocre.

Quanto aos “trabalhos mediocrizadores” a situação é ainda mais crítica. Os trabalhos em sistemas educacionais sérios têm por objetivo exclusivo desenvolver novas habilidades. Não é o caso da prática do ensino básico público brasileiro, com suas exceções, óbvio. Os trabalhos são visto como “meios” para atingir um “fim”: a aprovação do educando. O objetivo não é educar, mas aprovar, ampliar a popularidade política dos secretários de educação, via dados estatísticos frios.

Trabalhos em grupo onde o educador sabe que apenas um educando fez e os demais tiveram seus nomes inclusos; plágios de conteúdos disponíveis na internet; trabalhos elaborados por terceiros; trabalhos banais, como trazer objetos e materiais para aula… esses abarrotam as escolas de medíocres. Estudantes que serão aprovados sem conhecimento sólido. Alguns ainda ficam retidos por não atingir, mesmo com toda essa mediocridade, a média (que como diz a própria nomenclatura, é também medíocre). A esses são dadas três aulas e aplicado um conteúdo “hipermediocrizado”, devendo “tirar a média” para serem aprovados. Pronto! Aprovados mais alguns medíocres.

Quanto à seleção de conteúdos, notamos igualmente uma mediocridade profunda. Os conteúdos raramente ultrapassam os medíocres livros didáticos.

Certamente existem os professores bons, os ruins e os medíocres. As condições atuais propiciam uma formação docente medíocre. Isso por vários motivos. Dentre eles vemos: proliferação de cursos particulares de licenciatura de baixo custo, muitos desses à distância; O curso de licenciatura é o menor em carga horária; o professor ao receber salários medíocres não dispõe de condições financeiras para investir em sua carreira, assim como não lhe resta tempo por ter que lecionar para muitas turmas de mais de uma escola.

A proliferação de cursos de licenciatura com baixas mensalidades têm criando condições para que os estabelecimentos de ensino contratem professores com menores salários e, consequentemente, menos qualificados e motivados. Essa situação reflete na formação dos futuros professores. Tendo o curso de licenciatura carga horária menor, os conteúdos serão resumidos e/ou muitos nem serão transmitidos à turma. Somado a formação medíocre, o professor se depara com a dificuldade em manter-se informado e aperfeiçoar-se. Falta-lhe dinheiro e tempo. Com um salário baixo não tem condições de comprar livros, pagar cursos, participar de seminários e congressos. Ainda que tivesse poupado algum dinheiro, sua carga-horária o impediria. Somado a tudo isso, não vê motivos para se aperfeiçoar, pois, terá que ministrar aulas medíocres para não reprovar seus estudantes… que serão alguns dos futuros professores medíocres que farão parte do sistema de ensino medíocre.

Deveríamos ficar ofendidos não por sermos chamados de medíocres, mas por permitirmos que tenhamos um país medíocre. Ser medíocre na Holanda não é nada mal. Ser medíocre no Brasil já é bastante problemático.

Lamentavelmente os medíocres são fruto de um sistema educacional e uma cultura da mediocridade. Quem nunca ouviu um estudante dizer “passando está bom, É o que importa”? Essa afirmação é fruto de uma cultura mediocrizadora, que se repete em quase todas as esferas da vida social, inclusive na educação. Não quero ser medíocre, ainda mais no Brasil!

* Texto originalmente publicado no Portal 27 em 2013

Fonte: https://cafecomsociologia.com

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